segunda-feira, 25 de fevereiro de 2019

Crônicas de um pai: de repente quase 36

Crônicas de um pai: de repente quase 36

às vésperas de completar dois anos e três meses, maria luíza sabe sorrir. confesso que nos primeiros dias temi que ela herdasse meu cenho franzido. de tanto fazer caretas perdi o jeito de sorrir. quando maria nasceu parecia levar no rosto as minhas marcas. o passar dos dias, felizmente, mudou o curso das águas. a natureza fez bem e minha filha agora me ensina a rir do mundo e das nuvens.

Crônicas de um pai: a feira

Crônicas de um pai: a feira

domingo cedo, dia de feira. lulu ciente do passeio, chamava com insistência, 'por que estão atrasados?' ir à feira está entre os seus passeios favoritos. comer pastel, banana e melancia, tomate, maçã e pêssego. não sei como enche o tanque e redistribui tudo para recomeçar as degustações. adora o falatório, adora os cães que saem para o passeio, adora as vovós que lhe fazem a corte de chamegos. há tempo para olhar de perto o sol gigante pintado na fachada da escola. descobre os cílios e as sobrancelhas do sol buscando pelos meus para mostrar que aprendeu. diverte-se e, depois de tudo, coroa o passeio matinal visitando a padaria. 'não, não quero voltar'.

Crônicas de um pai: a adolescência e o colo

Crônicas de um pai: a adolescência e o colo

a adolescência dos dois anos, relatam os navegantes mais velhos, reserva mares revoltos. o choro corta o céu justo quando tudo era azul e não havia nuvens. por que, minha pequena lulu? conte-me o que a aflige.
de repente os pássaros voltam a cantar e a cara de choro abre-se aos sinais do dia claro. assim são os dias de uma jovem adolescente. de fato, ela parece apenas mais sensível ao bater das borboletas.
'não é fácil crescer, não é fácil ouvir todos os dias os pais dizerem que as roupas estão apertadas. não é fácil descobrir e aprender tanto a todo instante. não é fácil ouvir e responder a tantas perguntas do mundo novo'.
em meio a tudo isso, hoje, antes de sairmos, eu preparava o café quando ouvi o gemido de lulu. maneira usual de dizer: 'eu acordei, mas onde estão todos? por que me deixaram sozinha?' interrompi tudo e fui ao seu encontro. surpreendi-me ao encontrá-la engatinhando na sala escura. ela deixou a cama e começou a engatinhar e a esparramar a sua adolescência de menina.
não são revoltos os mares, são serenos, pedem apenas um pouco mais de colo. as tempestades são reais.

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2019

Crônicas de um pai: o que é isso?

Crônicas de um pai: o que é isso?

papai, o que é isso?
é um helicóptero
papai, o que é isso?
é um tapete.....

o número de vezes ao longo dia que ouço 'o que é isso?' não pode ser mensurado.
não cabe em um dia. fácil perceber que aqui e ali ela sabe do que se trata. já dominou os nomes e os significados. parece desejar saber quem está com ela e acompanha em sua caminhada de reinações.
estou aqui, minha filha, vou ajudá-la. adianto que sei pouco, mas é todo seu.

Crônicas de um pai: preciso

Crônicas de um pai: preciso

à medida do crescimento as frases ficam complexas. a série de pedidos que começam com o 'eu preciso' nos diverte. o 'preciso brincar' é o favorito. dito mesmo quanto está envolvida com algo e deseja mudar. parece dizer, 'cansei disso, agora quero brincar com os meus peixes na água'. muitas vezes o 'eu preciso' é mais encenado do que pronunciado. ela arregala os olhos, faz cara de espanto ao levar as mãos ao rosto e grita alto 'eu preciso do avião'.

Crônicas de um pai: o anel

Crônicas de um pai: o anel

dia desses dona vany trouxe anéis coloridos para maria luíza, acostumada a usar tudo que via - de lacres de caixas de leite a argolas de chaves - nossa filha encantou-se. a flor de plástico do anel não demorou muito e voou, ou melhor, o anel voou. maria luíza adora usar anéis para gesticular. mostra a si mesma e aos que a seguem o movimento de seus dedos de menina-quase mocinha. mostra como usar as pontas de suas asas. ganha os seus céus e depois fica a perseguir os anéis pelo chão de seu mundo. cá estou de gatinho a buscar pelo sumiço de suas peças de brincar.

Crônicas de um pai: ensina-me

Crônicas de um pai: ensina-me

crianças pertencem mais ao mundo que dá certo do que ao torto de cada dia. guardam e revelam de forma generosa os segredos da vida. nos lembram a todo instante que viver é o maior presente e que tudo, absolutamente tudo, merece um sorriso.
elas parecem viver em uma confraria de dons e de alegrias. cabe ao pai aprender que os pequeninos sabem muito e a hora de reaprender é agora.

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2019

Crônicas de um pai: 'papai, quero tetê!"

Crônicas de um pai: 'papai, quero tetê!"

a temperatura caiu, por fim uma noite fresca e agradável após a travessia seca e quente de janeiro. a chuva leve ajudou.
após jornada de trabalho o aconchego do lar e o repouso. a cama parece maior, o edredom está de volta ao convívio familiar. os olhos pesam e o frio convida a todos para a noite de sono.
eu e vany conversamos ainda uma vez a respeito do dia e do amanhã, trocamos silêncios. enrolo-me um pouco mais e sinto a suavidade do edredom cor de manjar de coco, sinto fome e vontade de manjar, mas calo-me para dormir.
olhos fechados e o sono que me abraça até eu ouvir: "papai, quero tetê! papai, papai, quero tetê, quero tetê!"
de volta ao mundo dos acordados, tropeço ao deixar o manjar de edredom, o joelho direito ainda falha. sorrio e digo a minha filha que vou preparar uma mamadeira especial. maria luíza mama de olhos fechados, antes de terminar, já está dormindo.
deixo a mamadeira sobre a pia da cozinha e volto ao quarto. silêncio e escuridão. deito e segredo algumas palavras para vany. volto-me para o meu travesseiro favorito: 'quero manjar branco, quero manjar, bom descanso vany, bom sono lulu'.

terça-feira, 12 de fevereiro de 2019

crônicas de um pai: west side story

crônicas de um pai: west side story

tantas vezes me pergunto como criar a cultura da paz. o mundo é feito de balas e de empurrões, como criar algo diferente?
enquanto minha filha aos meus pés brincava as suas canções de meninha-mocinha pulei canais de tv em busca de desenhos animados de sua predileção (sim, ela os têm!) e descobri o antiquiquiquíssimo west side story.
senti medo, medo do mundo. nada mudamos nas últimas décadas, uns e outros que por aqui governaram largaram exemplos do que não se deve ser. os cidadãos nas ruas fazem das suas, tropeçam uns nos outros e vociferam.
orgulham-se de si e tornam o mundo mais sombrio e duro. olho para minha filha, recito-lhe versos que falam de amor e de respeito, mas assombro-me com o que nos espreita.
fico a me perguntar pelos criadores daquele romeu e julieta moderno, da transposição do embate da história de amor para a sociedade das imigrações. lembro-me de tudo quanto ouvi nos últimos meses a respeito de famílias destruídas por guerras. não melhoramos.
como ajudo minha filha a crescer em um tempo no qual mentiras e arroubos, vitimizações e pedras são tão usuais?
minha filha nada percebe de meu desconforto, melhor assim, brinque minha filha, acumule sorrisos, você saberá melhor do que o seu pai atravessar tanto horror.

(até mais, natalie wood!)

Crônicas de um pai: as chupetas

Crônicas de um pai: as chupetas

elas apareceram, as chupetas. durante mais de 26 meses elas pouco estiveram presentes na vida de maria luíza. o início do desmame abriu as portas das chupetas, tudo acompanhado de doses maciças de dengo, de chamego e de uma vontade intensa de se sentir acarinhada.
ela nos surpreendeu, largou o peito de forma rápida, de quando em quando pede para vê-lo e sorri. ganhou mais tempo com a mãe, há tanto por fazer, bonecas e jogos de massa, ler livros e ajudar a fazer bolo.
o sono chega e é hora de dormir. lá vem a chupeta, mastiga-a durante instantes e, logo depois, a larga. adormece com a boca livre. cedo, ao acordar para ir à escola, precisará de alguns instantes com a chupeta, mas nada mais. há tanto a fazer, há o gira-gira para brincar e o balanço de sua vida.

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2019

Crônicas de um pai: será certo mesmo?

Crônicas de um pai: será certo mesmo?

dia desses eu me perguntei se a ajudava ou a atrapalhava. nossas conversas sempre foram francas. da cor da parede às primeiras impressões deixadas pelo morango em sua boca. do cavalo de brinquedo ao lugar do sol lá no céu. dou-me conta que dei-lhe regularmente o primeiro movimento. eu ouvia os motes e a acompanhava. falamos acerca de tudo e de todos. do tatu-bola que fugiu para dormir noutro canto cansado de tanto ser chamado por nós ou da 'linda rosa juvenil' nome que usa para chamar a roseira branca de nossa casa. da busca por caminhões e aviões. nada nos escapa.

creio que exagerei, julguei necessário introduzir noções de tempo em nossas conversas: hoje, mais tarde, depois...agora vejo que lulu não precisa disso. o seu tempo é o melhor, a sua hora não tem ponteiros. a sua descoberta vai de uma nuvem à outra sem se preocupar com parâmetros. o tempo estraga tudo, melhor deixá-la, melhor dizer que o relógio quebrou e a hora é agora. a felicidade mora aqui, não vive acolá. não, não como os hedonistas, que, de fato, são o que são, porque tem pressa e a ânsia de algo perder. tristes os hedonistas. desejo-lhe, lulu, que viva feliz (sem começo, sem fim, simples assim).

Crônicas de um pai: escovar os dentes

Crônicas de um pai: escovar os dentes

lulu anda a escovar os dentes diversas vezes ao longo do dia. deu-se conta de que a pasta faz espuma azul. lá vamos nós: 'qué escova dentinho'. eu a coloco em posição que possa ver o espelho e lá fica a nossa pequena maravilhando-se com a sua imagem. sorri azul e suspende tudo de repente. busca pela minha escova e pasta e as entrega, 'papai precisa escova'. (ela sabe distinguir, apenas não consegui evitar que as escovas sejam usadas também em bonecas e carrinhos; dá para imaginar nossa filha escovando os dentes, digo, pára-choque de uma kombi?)

Crônicas de um pai: 'preciso de ajuda, não consigo'

Crônicas de um pai: 'preciso de ajuda, não consigo'

entre as situações inusitadas estão as que começam com 'socorro, preciso de ajuda, não consigo'. tudo acompanhado de uma empostação de voz que garante sofrimento e dramaticidade.
não sei se dou risadas ou a acudo. de qualquer maneira, resolvido o problema lulu segue em suas reinações.

domingo, 3 de fevereiro de 2019

Crônicas de um pai: amanhece

Crônicas de um pai: amanhece

a noite e a longa madrugada ficam para trás, lulu dorme, está cansada. parece haver um tanto de calor e o momento do desmame, aborreceu-se com o travesseiro e a fome, as saudades da mãe e o ar seco, aborreceu-se e pediu colo e ajuda.
quis tomar mamadeira, precisou trocar as fraldas e, sobretudo, pediu colo e cafuné para atravessar as horas. gritou alto e chorou, desfez-se em lágrimas como a atriz que vive tragédias no palco. agora, amanhece e lulu dorme.
aceitou o sofá, deitamos os dois e contei-lhe o porquê da noite e do dia. aceitou a chupeta e fechou os olhos. de tanto me ouvir, respirou fundo e dormiu. ela está cansada da noite mal dormida e solitária. eu velo pelo seu sono, pesado e cheio de cansaço.
boa noite, boa manhã, minha filha!