terça-feira, 19 de março de 2019

Crônicas de um pai: O vitral de Santa Ana

Crônicas de um pai: O vitral de Santa Ana

adoro o meu bairro, acostumei-me a caminhar por ele. o correr dos dias muitas vezes me leva para longe e os passeios para descobrir os ajardinados tornam-se raros.
de certa forma o afastamento me livrou de acompanhar a sua degradação e o surgimento de outro bairro. o casarão neo-colonial da voluntários da pátria de fachada de azulejos azuis deu lugar a um prédio de escola. bem poderia ser academia ou pet shop.
o sebo favorito foi devorado junto com os sobrados com os quais fazia parede e nasceu um prédio gigantesco e horroroso. daqueles que se vê de longe. não há cuidados com a paisagem, não há olhar que resista, melhor não ver nada.

em meio à minha desolação aconteceu festa da família no colégio de maria luíza. foi quando descobri o vitral de santa ana. escondido em capela da voluntários da pátria e pertencente às irmãs de são josé de chambery há um dos vitrais mais bonitos do bairro. há duas capelas das irmãs, uma que fica na voluntários e outra, reservada. a primeira eu já conhecia, a segunda revelou-me o vitral.

outrora o bairro tivera casa de artesãos de vitrais, eram outros tempos. agora, a moda é espelhar tudo. fiquei ali impressionado com a riqueza de cores e detalhes daquela santa ana. o manto púrpura, a maria menina que recebia o seu abraço. não havia um são joaquim do outro lado da nave, para criar simetria e sugerir o deambulatório criado pelos medievais, os demais vitrais eram simples em sua geometria, não havia representações.
lá estava a senhora que dá nome a um bairro inteiro, bairro de milhares de moradores e de outros tantos de passantes. ônibus azuis desgovernados e deseducados motoristas. santa ana estava impassível em sua calma em meio ao alarido das crianças que chegavam para a celebração. sussurrou ao meu ouvido que era preciso buscar o que permanece, o perene e sinceramente ter paciência com os prédios de escritórios que enfeiam a minha Santana com espelhos azulados.

(maria luíza assistia a tudo deitada no colo de sua mãe; tirou a chupeta da boca é me disse que já conhecia aquela santa ana de outras 'tividades')

Nenhum comentário:

Postar um comentário