sábado, 26 de janeiro de 2019

Crônicas de um pai: deixar o peito

Crônicas de um pai: deixar o peito

após dois anos e dois meses iniciamos a operação 'deixar o peito'. simples e trabalhoso. há tempos, maria luíza adotou o estilo da lasanha ao peito, do arroz e feijão ao mamá, das batatas ao colo da mãe.

as últimas horas são de conversas e de histórias, as vezes longas e incertas outras bem sucedidas. noite passada, lulu vivendo o seu faz de conta pegou o telefone e disparou: 'alô, dôtora! mamãe tá dodói peito e nenê tá com fominha!'

a mãe que por tudo chora, molhou o travesseiro uma vez mais.

Crônicas de um pai: dia de pediatra

Crônicas de um pai: dia de pediatra

o que faríamos sem os médicos que nos acompanham ?

alguns chegam a nos atender em horários adicionais e nos revelam os segredos de seu ofício, raro.

sexta última foi dia de pediatra. o prédio era novo, todavia, por ser a mesma clínica que lulu visita desde que nasceu a paisagem dos corredores nada mudou. sabia bem onde estava e tinha receio disso.

apesar dos riscos brincou as suas brincadeiras pelos corredores, distribuiu sorrisos, pediu água 568 vezes apenas pelo fascínio de ver a água descer pela torneira branca. tudo mudou, quando fomos chamados. recolheu-se para saber o que a aguardava.

sorriu (quase) feliz ao reencontrar a doutora camila, estava desconfiada. ouvia tudo que conversávamos e aqui e ali reforçava nossas frases com as suas observações. nada mais justo, afinal ela era assunto, nada mais justo que contasse sobre si mesma.

a maca.

a maca do consultório trouxe tempestades e lágrimas, o oco do mundo ameaçava tudo engolir. as ondas serenaram quando lulu percebeu que já estava de volta ao colo de sua mãe. a janela se abriu e o sol voltou.

o retorno para casa foi tranquilo, as chuvas reais deixaram as ruas limpas e frescas. no caminho de volta uma parada na farmácia e outra na padaria. bem conhecida e mimada a pão-de-queijo na padaria lulu disparava: 'fui na médica, não estou doente!'.

ficamos intrigados, afinal quem falou de 'estar doente'. nós lhe dissemos apenas que visitaríamos a camila. é certo que sabe o que é um hospital, é certo que reconhece a sua pediatra. lulu cresceu e sabe o que significa 'estar doente' e, agora, está feliz porque não está.

basta agradecer o pão-de-queijo e deixar a padaria sorrindo, a chuva passou definitivamente.

Crônicas de um pai: boa noite, mamãe!

Crônicas de um pai: boa noite, mamãe!

não há mais reservas, maria luíza sabe do que estamos falando que o diga os seus pitacos certeiros nas conversas que eu e dona vany mantemos. vez por outra ainda troca aqui e ali os significados quando, por exemplo, acredita que ao falarmos do que acontecerá na segunda-feira julga que estamos tratando do que fazer na feira (lulu adora feiras).

de tanto ouvir boa-noite dos pais, agora é a sua vez:

'boa noite, mamãe!, boa noite, cacá!, boa noite borboletinha!, boa noite, cavalo!, boa noite, mamãe!, boa noite, naná!, boa noite, titia!, boa noite, vovó!, boa noite, peppa!, boa noite, peppa!

domingo, 20 de janeiro de 2019

Crônicas de um pai: a feira

Crônicas de um pai: a feira

alimentar-se bem de forma correta e na hora certa, assim é. tentamos. a vida de quem trabalha fora de casa pede malabarismos. lembro-me que nossa pediatra na primeira consulta falou da regularidade de horários.
conseguimos sem dúvida, há uma única exceção: a feira. quando lulu vai à feira as refeições sofrem variações. ela adora degustar e comer. hoje, por exemplo, largou a banana prata que estava quase no fim por um tomate fresco, assim caminha o meu mundo.
como vamos manter a dieta regulada e cronometrada? a feira subverte tudo e para piorar ainda há uma barraca de pasteis ao lado da de caldo de cana em nosso caminho.

Crônicas de um pai: papai josias

Crônicas de um pai: papai josias

lulu ofereceu-me muitos nomes nos últimos anos, pai transformou-se em baba, papul e outros tantos. fui chamado, também, pelos nomes que dona vany me deu ao passar dos dias.

pois bem, agora sou 'papai josias'. isso mesmo, lulu chamou-me assim. lembrei-me de pronto quando menina de poucos meses quando eu trocava as suas fraldas maria luíza esticou as pequenas mãos e ficou a tocar o meu rosto.

curioso saber que ela me chama assim apenas para a mãe, ainda espero ouvir o novo nome.

já tenho o meu lugar no mundo.

sábado, 19 de janeiro de 2019

Crônicas de um pai: o amarelo no quadro

Crônicas de um pai: o amarelo no quadro

parei em frente ao quadro e imaginei o artista com as suas cores. deixou de lado as formas conhecidas, esparramou com o pincel até que houvesse apenas a cor, ou antes, cores que se transformavam em outras, nuances que não seguiam as combinações da palheta. voltei-me para o artista e perguntei-lhe por que assim, o que desejava? absorto em sua demanda seguiu a sua composição. eu nada entendia e gostava, a subversão das combinações e o verde, o verde perdido em meio ao lilás e ao amarelo. fiquei ali, de pé. nada fazia sentido, parecia nada dizer ou dizia apenas que gostava assim.
maria luíza, ao pé de mim, chamou-me pela mão. esqueci-me do quadro do consultório da nutricionista e voltei-me ao ateliê de arcangelo ianelli. voltei ao dia em que descobri quadro de coleção particular no qual pintava a si mesmo em seu ateliê. ianelli trabalhava em tela grande, a luz que invadia o cômodo era intensa e ao seu lado, mocinha de talvez 8 anos, estava a sua filha. tranças longas, vestido amarelo. andava interessada no que o seu pai fazia com os seus brinquedos. ficou ali, deixou os seus próprios de lado e ficou ao lado do seu pintor.
venham, dona vany e lulu, já nos chamam, vamos ao consultório tratar com a nutricionista sobre ianelli e as cores.

terça-feira, 15 de janeiro de 2019

Crônicas de um pai: 'quero médico, quero remédio'

Crônicas de um pai: 'quero médico, quero remédio'

os últimos meses foram de calmaria, foram poucas as visitas médicas. bem diferente do primeiro ano. lembro-me de quando era preciso oferecer-lhe xarope e outros medicamentos via oral, era uma batalha. parte do medicamento ficava esparramado pelas nossas roupas e outra tanto lulu lançava longe.
os nossos cuidados tornaram os meses recentes serenos, lulu goza de boa saúde e cresce dentro do esperado. todavia, agora ela pede remédio. acreditamos que tenha a ver com músicas infantis nas quais os pais telefonam ao médico pedindo ajuda e, nos últimos dias, a minha cirurgia. ambas as situações contribuíram e, agora, nossa filha diz precisar de médico e abre a boca. lá vamos nós: 'aqui está o seu remédio, lembra a água e o suco, mas, de verdade, é medicamento feito de pelo doutor médico que acompanha o seu caso'. Durma bem, minha filha!

sábado, 12 de janeiro de 2019

Crônicas de um pai: vai dormir, papai!

Crônicas de um pai: vai dormir, papai!

bem que podia ser a hora do repouso, eu estava exausto. esperava ansioso que ela adormecesse. combinei com a casa que era hora de silêncio, trouxe a mamadeira e resgatei cacá, a fiel companheira, que foi ternamente abraçada por maria luíza. tudo caminhava bem, reinava silêncio, pouca luz, mamadeira, cama gostosa, e, de repente, ainda com os olhos pesados, maria luíza voltou-se para mim e disse: 'não, papai, não vou dormir! vai, papai! vai dormir!'. não bastasse dizer isso, usou o pequeno dedo para fechar os meus olhos...

em meio a tantas descobertas, dormir não está em sua programação.

Crônicas de um pai: avião

Crônicas de um pai: avião

era um velho avião, um mirage machucado pelos longos voos. hoje, ele está em um dos acessos ao Campo de Marte. estacionado como se estivesse ganhando os céus em manobra acrobática.

de nada interessaria se não fosse caminho para o parque de areia no qual lulu brinca. menina-quase mocinha sabe reconhecer os caminhos que faz. ela associa cores e paisagens. apercebe-se do caminho e grita a cor e depois ouvimos um sem número de risadas.

pois bem, agora, o caminho do parquinho ganha gritos e gritos de avião. chama de todas as formas a nossa atenção para o que vê. da última vez descemos e a deixamos caminhar sob as asas do engenho suspenso no ar. maravilhou-se.

a hora de dizer adeus foi difícil. esperneou, mas logo convenceu-se que ainda havia um tanque de areia para brincar de construir e desmanchar. sentada em sua cadeira olhou de sua janela favorita e disse: 'tchau, avião, vá dormir!'

Crônicas de um pai: 'formiga, venha tirar foto!'

Crônicas de um pai: 'formiga, venha tirar foto!'


os brinquedos e as brincadeiras seguem as horas e as nuvens. a máquina fotográfica de lulu é das mais constantes. descobriu o visor, aprendeu a enquadrar com as suas mãos de menina-quase mocinha a paisagem na qual reina.

logo cedo, caminha rápido em direção ao quintal e chama os seus parceiros: formiga, tatu-bola, aranha e abelha. 'Formiga, venha tirar foto!'. Decidida, nada a impede em seu desejo de distribuir bom dia aos visitantes e chamá-los para fotografias.

determinada mesmo quando usa a máquina ao contrário oferecendo o visor à dona formiga e a lente
permanece voltada para o seu pequeno rosto. lulu diverte-se e ri. será que deseja ser fotografada? o que vê o tatu-bola ao olhar pelo visor? dona abelha sorri ao ver pela primeira vez bem de perto os olhos de nossa filha?

nosso quintal é maior do que pensávamos.

terça-feira, 1 de janeiro de 2019

Crônicas de um pai: cuidado!

Crônicas de um pai: cuidado!

'meu diário,
algo mudou nas últimas semanas. meu pai, tempos atrás, oferecia-me palavras novas aos montes. ele as trazia em seus bolsos e as largava frente aos meus olhos. lembro-me do dia em que falou-me do firmamento. explicou-me a sua importância para a aventura e o porvir. contou-me sobre neologismos e mostrou-me a coleção de dicionários de nossa casa.
agora, meu pai mudou. repete o vocábulo 'cuidado' aos borbotões. ele não me entende, não percebe que estou ciente dos riscos. crê que atravessar a rua sem olhar para os lados em busca de passarinhos é arriscado. conversa intermináveis segundos comigo para se explicar. 'cuidado, cuidado!' quando mais precisava de palavras novas para entender o mundo, mais ouço a mesma'.